19 outubro 2016

Trajeto

Se a gente dividiu o mesmo vagão, porque não podemos dividir a vida?

Saia de trás desse homem comendo fofura de cebola, expulsa o dorminhoco do meu lado e senta aqui.

Deixa eu saber o que você está ouvindo, me diz o porquê fez essa tatuagem no antebraço e me conta quem te deu essa pulseira.

A vida é esse trajeto de idas e vindas e em cada estação uma surpresa. Então aproveite, pois a próxima pode ser a final.

18 outubro 2016


Você me parece tão distante, intocável tanto em cima quanto fora no palco, não saberia como me aproximar, de longe te admirava e sentia seu ritmo dominando cada parte de mim. Começou me aquecendo e acelerando por dentro, um calor que foi se propagando pela minha pele até as extremidades do meu corpo, em menos de um minuto eu já estava dançando no seu tempo.

Tive vontade de abrir o resto da sua camisa e colar seu corpo suado no meu, te levar para aquele túnel escuro perto do palco e torcer para que você me jogasse na parede e me surpreendesse com um beijo no pescoço enquanto te agarrava pelos cabelos. Nossos corpos se entrelaçavam naquele suingue latino, minha cintura dançava ao encontro da sua e grudavam iguais ímãs. Sentiria seus dedos me percorrendo, me dedilhando como o teclado que você tocava antes.

As pessoas dançavam ao meu lado na pista e eu parada te observando, me imaginava pós show, após todo mundo ter saído, subindo no palco, sentando no teu colo, entrelaçando minhas pernas em você, ficando entre teu corpo e o teclado. Continua! Toca de novo. Toca aquela música que você sabe que gosto.

Alguém pisou no meu pé e acordei da ilusão que me encontrava. O calor da pista e a certeza de que estava com pensamentos errados me fizeram sair. Fui embora antes que o show terminasse, pois assim sempre teria a desculpa de voltar para o bis, pedir mais uma.

02 outubro 2016

Olha pra mim

Era a primeira vez que assistia ao show daquela banda que há anos ouvia. Só conhecia as vozes, não sabia como eram os rostos deles, não sabia o nome de nenhum integrante - devia ser preguiça de pesquisar - mas sabia de cor todas as músicas dos dois cds.

Iria ter um mini festival de três bandas: uma que nunca ouviu falar, que seria a primeira a tocar; uma que ela idolatrava e conhecia bem os integrantes e a essa outra que ela curtia muito, mas não era tão íntima - foi nesse show 90% só por causa deles, precisava vê-los de perto, sentir essa energia ao vivo e conhecê-los.

O primeiro show era de um grupo que tocava músicas de faroeste vestidos a caráter, era bem ok, nada de super, porém faltava algo. O instrumental era incrível, entretanto ela sentia falta de letra nas músicas - como uma boa redatora gostava de escrever, de ler e conhecer a pessoa por aquilo que ela compõe. Por isso nem focou sua energia neles, queria a segunda banda.

Eles subiram no palco e como num jogo de vídeo game, a barrinha de energia dela se completou na hora. Se arrepiou, cantou, gritou, ficou sem voz, dançou, requebrou, tudo que tinha direito naquele show.

A banda era ótima, instrumental maravilhoso, letras deliciosas, presença de palco marcante, mas o foco dela se perdeu um pouco naquele momento. Na voz poética, naqueles olhos de galã de filme estrangeiro, naquele cabelo despenteado, já falou na  voz sensual? O foco era o contrabaixista, ficou besta ao vê-lo na frente dela. Não sabia que era um dos vocalistas principais e aquela música que ela delirava ouvindo no celular,  era ele que cantava.

Queria correr atrás dele no camarim, ver se os dedos dele eram bons fora do contrabaixo. Queria puxar aquele cabelo pra perto e fazer ele cantar no ouvido dela. Queria estourar os botões da camisa que o música usava e compor uma melodia no corpo dele. Queria ver ele ainda tinha energia depois do show.

Ele cantava:

"Ah olha pra mim quando esbarrar por aí
Faça alguma coisa só não me ignore assim
Cansei de ser só um, mais um em mil"

Saindo do devaneio que se encontrava voltou para casa leve, cheia de energia e vontades. 

Hoje ela sorri com malícias quando ouve a voz dele e pensa: e se eu te encontrar por aí posso te falar das minhas vontades com a mesma facilidade que você toca? Se eu te falar quem sou vai me ignorar ou esbarrar em mim?

Foco

- Fecha nela, pois este ângulo está melhor - falou a produtora do curta metragem.

O câmera/diretor olhou torto, engoliu em seco. Se incomodava quando opinavam em cima da sua criação.

- Você gosta de mandar? - perguntou ele meio bravo/irônico.

- Só no trabalho, entre quatro paredes eu prefiro obedecer.

Ele ficou boquiaberto e sem reação. Ela sorriu e partiu, voltou a trabalhar, precisava resolver outras coisas importantes do evento.

Se conheciam há tempos mas nunca trabalharam juntos. Ele era mais novo que ela, usava dreads no cabelo, algo que ela não era fã e devia ter mais de 100 contatos no celular para uma pegada fácil.

O sábado havia sido longo, acordou cedo, ajudou mil equipes, fez inúmeras coisas. Estava esgotada física e acabada mentalmente.

- Precisamos gravar o pessoal da técnica no camarim menor. A luz lá é boa? - ela falou.

- A gente se vira naquele lugar pequeno...


- Meu sonho sempre foi pegar alguém lá... Adoro lugares apertados.

- Você não pode dizer uma coisa dessas para mim enquanto eu trabalho... Eu fico desestruturado... Perdi o foco...

- Desculpa, foi só um comentário aleatório...


Gravaram o depoimento da pessoa que faltava e decidiram, checar o material que tinham e ver se faltava alguém. Ele fechou a porta do camarim para não atrapalhar a checagem do som da câmera. Sentaram em frente ao espelho e colocaram o equipamento na mesa.

Viram uns depoimentos enquanto ela fazia umas anotações e ouvia o que o dizia o pessoal:

- Você acha que a gente tem que gravar este aqui novamente? O Sol na cara dela ficou ruim... Hey! Está me ouvindo?

- Eu parei de prestar atenção no que me dizia no momento em que você falou sobre seus desejos neste lugar....


Sentada ela empurrou com o pé o apoio da cadeira dele para trás fazendo com que ele se afastasse da mesa.

- Então é minha chance... -
falou a moça sentando no colo do rapaz.


As mãos dele percorreram as coxas e terminaram apertando a bunda. Os lábios dele eram mordidos por ela depois das línguas terem se encontrado.

- E qual é seu desejo? Seu fetiche?

- Sempre quis gravar eu com alguém.

- Então a gente pode realizar dois sonhos de uma vez -
falou a moça virando a câmera para eles e apertando o botão para gravar.


Lentamente foi desabotoando a camisa preta que usava deixando as costas nuas para a gravação.