22 setembro 2019

UBER

Estava a caminho de um show em uma unidade do Sesc próxima ao centro da cidade. Apesar de ser perto da saída do metrô, não quis arriscar e pediu um Uber.

Pelo aplicativo viu a foto do motorista - que tinha o mesmo nome do ex - a placa do carro e onde ele estava. Percebeu que ele mudou de rota duas vezes antes de ir buscá-la, e já estava querendo cancelar a corrida quando ele chegou.

Abriu a porta do carro e sentou no banco do passageiro ao lado do motorista - uma mania dela. Deu boa tarde e se virou para perguntar se tudo bem ela sentar ali. O motorista sorriu e disse para ela ficar a vontade - gato não peça isso.

Desiludida com a vida profissional e pessoal, indo para um show afogar as mágoas e o motorista é aquele padrão que a deixa maluca: alto, magrelo, cabeludo e de coque - bem diferente da foto do perfil.

Era professor de educação física, deu aula de capoeira e morava por ali no centro. Mesmo sentindo seu rosto ficando vermelho, quando ele falava alguma coisa, ela fazia questão de olhar para ele, que tinha um jeito tímido e intelectual. Contou que morou na Austrália por um tempo e que voltou para o Brasil há pouco. Disse tinham ido e voltado. (Tinham? Você e quem? Você e seu cachorro? Amigo? Mulher? Perguntas que ficam apenas na cabeça para não ser acusada de assédio). 

Por que esse tipo de viagem é tão curta?

A gente nunca sabe qual vai ser o tipo de viagem quando embarcamos. Se vai ter mais alguém, se vai ter muita bagagem, muito trânsito, música ruim, direção perigosa; a gente só embarca e segue viagem.

Mas tem viagens que a gente quer repetir, dar mais uma volta, conhecer lugares não visitados, músicas não ouvidas, textos não discutidos.

Ela chegou ao Sesc com uma vontade de saber nome, endereço, estado civil do moço, mas fechou a porta e deixou ele seguir viagem, pois ela esta prestes a embarcar em uma outra.