02 abril 2017

Fumaça

Meu rosto está colado no teu peito pouco cabeludo, minha cabeça se movimenta de acordo com sua respiração, descendo e subindo. Escuto seu coração acelerado e percebo que está no mesmo ritmo que o meu.

Minha mão desliza pelo outro lado qual não estou apoiada. Do pescoço te aliso até o umbigo e brinco nesse percurso diversas vezes até decorar cada pedaço do seu abdômen.

Sinto nossas peles se tocando. Minha coxa cruza sua perna e te encaixa em mim, sua coxa quente suada gruda na minha fria. Nossos pés também se tocam de leve, se sentem.

Vejo a fumaça dançando pelo quarto a meia luz. Bem de perto reparo no movimento da sua boca durante o trago, na pressão que seus lábios fazem no cigarro, e como eles ficam menos tensos quando você expele esse ar fedido. Eu sempre odiei esse cheiro, mas quando você o solta não me importo; a gente até brinca de descobrir desenho no ar.

A fumaça dança livre e solta pelo quarto em cima da cama, como eu estava ontem a noite no seu colchão. Dançava para você me fotografar, filmar, gravar meus detalhes até me convencer a posar nua para você.

Arranquei meio sem jeito meu tênis e meia, fiz um charme tirando a calça e virando de costas para você ver o detalhe de renda da minha calcinha. A camiseta branca e o sutiã voaram na sua direção enquanto eu ficava nua no meio do teu quarto.

Baguncei toda sua mesa perfeitamente detalhadamente arrumada, jogando tudo no chão e sentando em cima. Estava nua na sua mesa e olhando para você. Coloquei as pernas cruzadas pra cima ao meu lado e inclinei o corpo quase deitando, ficando apoiada pelo cotovelo, e a com a mão na cabeça. Te sorri e disse para começar.

Você tirou da mochila seu caderno e estojo. Escolheu o melhor lápis e pegou a borracha. Aumentou a música que tocava no seu notebook, puxou a cadeira que estava ali perto e sentou na minha frente. Me observou, mediu cada centímetro do meu corpo - e esse olhar ainda me causa arrepios- e começou a me desenhar.

Você tensionava os lábios,mordia o inferior quando se concentrava; seu pé direito balançava de acordo com a música - te sentia inquieto, via seus ombros tensionados assim como o movimento do seu braço.

Quatro músicas já tinham sido nossa trilha sonora, fazia mais de vinte minutos que eu estava naquela pose. Meu braço já estava formigando, minha musculatura tremia, não aguentava mais. Por cima do caderno você me olhou e deu seu sorriso mais safado dizendo para esperar mais um pouco.

Acabei! - você falou entusiasmado levantando da cadeira.

Desabei para trás deitando as costas na madeira fria. Meu braço e pescoço doíam. Estava dolorida, mas super curiosa. Queria ver o desenho. Você o trouxe até mim e eu fiquei boquiaberta, quase sem reação. Estava lindo, perfeito! Minhas marcas de expressão, meu sorriso torto, até a pintinha da minha barriga foram retratados com muita fidelidade.

Ao me lado você começou a massagear meu braço e ombro dolorido, enquanto eu ainda admirava o desenho. Os carinhos da sua mão se transformaram em beijos e fui beijada do pescoço até a ponta dos dedos. Tu pegou o desenho, colocou na cadeira e me ajudou a levantar, me conduziu até a cama e me deitou. Agora fazia massagens e dava beijos no outro braço. Posicionou seu corpo em cima do meu e nossas bocas se encontraram como seu lápis no papel, forte e cheio de movimentos. Suas mãos me tocavam como se estivesse fazendo rabiscos com os dedos, seus traços eram leves no começo, depois foram ficando mais fortes, saindo do rabisco para a arte final.

Nossa obra ficou espalhada pelo quarto; roupas, lençóis, cadernos e lápis estavam perdidos no meio da nossa bagunça criativa. A arte me consumia, fiquei sem ar com o coração acelerado e pernas tremulas. Te abracei, deitei no teu peito, você esticou o braço e acendeu um cigarro. Reparei na fumaça que subia. Fumaça essa que dançava livre e solta pelo seu quarto, igual a mim ontem a noite...




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